segunda-feira, abril 16, 2007
"Estou a ter um dos piores dias da minha vida". Foi assim que ele se apresentou à minha frente. Andrajoso, encostando dois dedos em forma de arma à tempora direita. Quando nos entre-olhamos acho que ele me reconheceu. Nunca nos tinhamos visto ou ouvido mas ambos deambulavamos pelos mesmos sitios. Na altura estive para lhe dizer "Eu tambem" mas achei desnecessario por saber exactamente o que ele queria. Quando se esta muito tempo sozinho, essa solidao torna-se parte de nos. Seca-nos por dentro. Dei-lhe todo o dinheiro trocado que tinha nos bolsos. Odeio pensar que dar dinheiro figura na categoria da "ajuda". Ele precisava para comer e eu limitei-me a aceder ao seu pedido. Nem fui capaz de dizer nada. Irrita-me agora pensar que ele é que andava a pedir e no entanto estava escrito que nos iamos encontrar ali para ele me ajudar. Irrita-me porque ele me ajudou e a unica coisa que fui capaz de lhe dar foram uns miseros pences que estavam afundados nos meus bolsos. Criou-se uma especie de impasse. Eu senti que ele queria dizer qualquer coisa. Eu proprio tambem o queria. O meu comboio chegou. Peguei nas malas e afastei-me. Sabendo, de antemao, que tudo acontece por uma razao, so aí percebi o porquê de ter apanhado o comboio errado uma hora antes, à saida do aeroporto. Chamou-me e disse: "No fundo, acabamos por ser como as crianças. Se nos baterem muito ficamos a pensar que realmente fizemos alguma coisa para merecer isso. Nao te preocupes... vai ficar tudo bem"
Francisco
0 toes just touched the water
0 Comments:
Post a Comment